sexta-feira, 14 de março de 2008

Que horas são?


Que pressa infernal! E este elevador que não chega. Não fossem os andares que me separam da garagem, já teria descido as escadas.


Ih, esqueci meu relógio. Atrasada e sem relógio, é impossível.


Aonde mesmo que eu o deixei? De volta, abro a porta do meu apartamento e vou em direção ao meu quarto. Só posso tê-lo esquecido por lá.

Abro a gaveta do criado-mudo, a porta do armário, a caixinha de bijuterias...cadê o meu relógio?!


Parada na porta do quarto tento impacientemente lembrar aonde foi que eu larguei meu relógio. Não adianta, sem meu relógio eu não vou!


Entro no banheiro, com a sensação de "última tentativa" e logo percebo que se de fato quero o relógio, esta então será a penúltima delas.


Parada ali, grudada na pia, abro e fecho o armário que fica bem acima dela.


Ah estes armários! Todos quase iguais. O meu ainda simula um destes que se vêem em camarins de teatro.


Num ato viciado, acendo as três lâmpadas fortes que ficam logo acima do espelho e dou de cara comigo mesma. Com os olhos um pouco fechados tento inutilmente perceber uma outra figura, que não seja a minha, refletida naquele espelho.

Ainda assim, afasto-me um pouco, ajeito os cabelos, viro como quem quer ver o próprio perfil e do nada esboço um choro.


Não!!! Eu não quero chorar. Rapidamente apago as luzes do banheiro, saio e volto para o meu quarto. A porta se fecha atrás de mim. Um silencio ensurdecedor é interrompido pela musica que agora canto em pensamento. Você não sabe!


Cantou talvez despretensiosamente aquela musica pra mim. Depois disso, minha noites, meus dias, meu caos foi embalado por ela...tenho certeza, você não sabe!


Troquei os lençóis hoje de manhã. A cama cheira comfort. Lençóis macios, travesseiros jogados displicentes sobre a cama e num impulso, de sandália e tudo, jogo-me ali. Dois pensamentos: a música...o relógio.


Como é duro dar-se conta que o poeta tinha razão: "o momento prá ser bom, só deve ser assim, roubado" - e de mim roubaram o tempo. Eu tenho de sair, tentar ser feliz e em poucas horas voltar para minha realidade. É uma visão cruel da felicidade, a "feliz-realidade" roubada em tempo, em minutos, segundos, poucas horas.


A música ainda toca no meu pensamento, sentida por este coração que só queria ter o seu momento de felicidade.

De sobressalto olho o rádio-relógio que está logo ali, em cima do criado-mudo.


Meu Deus, a hora passou! Perdi você novamente.


Arranco a sandália, apago a luz do abajur. Absorta em pensamentos fragmentados do que já tive de você um dia, lembro-me que a bateria de meu relógio acabou e que ele neste momento(desperdiçado) está jogado em minha bolsa esperando uma bateria nova.


E foi na busca da hora, na tentativa cruel de controlar o tempo, que eu desperdicei o momento onde eu poderia tê-lo eternizado em mim.


Amanhã. Amanhã, quem sabe, eu não me preocupe mais com a hora?!


Amanhã talvez eu tenha todo o tempo pra ser feliz.

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